O fora não é o além-mundo
As experimentações
programadas com as drogas em Castañeda desfazem as interpretações e o
significante. É impossível associar o cão do efeito-droga com o papai-mamãe. A
droga agita o processo devir-animal, que não quer dizer nada além do que ele se
torna ou o faz-se tornar com ele. Não só o devir-animal.
Em Castañeda, há uma grande
riqueza de devires-moleculares: “(...) o ar, o som e a água são apreendidos em
suas partículas, ao mesmo tempo em que seus fluxos se conjugam (...). Todo um
mundo de micropercepções que nos levam ao imperceptível.”[1]
A ordem é experimentar, e não interpretar. Dom Juan adverte seu aprendiz de
feiticeiro: “A coisa especial a se aprender é como chegar à fresta entre os
mundos e como entrar no outro mundo. Existe uma fresta entre os dois mundos: o
mundo dos diableros e o mundo dos
homens vivos.”[2]
A realidade
entremundos se abre nos sonhos, sobretudo naqueles em que o sonhador se
encontra acordado. É preciso aprender a arte de sonhar acordado. “Existe um
lugar onde os dois mundos se sobrepõem. A fresta está ali. Abre e fecha como
uma porta ao vento. Para chegar lá, o homem tem de exercer sua vontade.” Como
dizem Deleuze/Guattari, talvez as crianças tenham a percepção desses
entremundos, os loucos e os primitivos.[3]
“Posso dizer que ele deve ter um desejo invencível de fazer isso, uma dedicação
total. Mas ele tem de fazê-lo sem o auxílio de qualquer poder ou de qualquer
homem.”[4]
Ou seja, o experimentador usa a droga nas experimentações iniciais, mas deve
aprender a “andar” sem ela. Assim como o próprio Deleuze defende: “Tentamos
extrair do álcool a vida que ele contém, sem beber: a grande cena da embriaguez
com água pura em Henry Miller: abster-se do álcool, da droga, da loucura, isso é
o devir, o devir-sóbrio, para uma vida cada vez mais rica.”[5]
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