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Mostrando postagens de janeiro, 2013

As salas das máquinas

É só um modo de dizer - “salas” - dos mundos que se compõem e se opõem muitas vezes. As máquinas não são metáforas de máquinas, são realidades materiais palpáveis. São modos de funcionamento do mundo sem a clássica separação de meio ambiente e o resto. Natureza e cultura compõem o ambiente que temos – o mundo - são “as salas das máquinas” com seus múltiplos sons e ruídos. O termo “máquina” se remete ao desejo e ao seu modo de funcionamento. O desejo é máquina de agenciar tudo. Mas não existe nenhuma garantia quanto a qualidade dos agenciamentos. O desejo, sempre opera por agenciamentos, que podem ser afirmativos da vida ou de negação dela – negar a vida é não ir ao limite do que se pode. As máquinas são os modos desejantes dos agenciamentos. Quando as máquinas são de natureza fascista, os fluxos de desejo são capturados e marcados para o fascismo – a juventude do nazismo alemão, por exemplo. Um poder despótico cria uma máquina despótica, captura fluxos de desejo, codifica

Máquinas

  Lembramos que esse conceito, desenvolvido no conjunto da obra Capitalismo e esquizofrenia (Gilles Deleuze e Félix Guattari), se encontra mais bem elaborado no volume O Anti-Édipo. A obra toda está traduzida para o português e publicada pela Editora 34. Existe uma tradução brasileira muito boa de Luiz B. L. Orlandi. O conceito de máquinas está diretamente relacionado à questão do desejo. Por isso, a noção de “máquinas desejantes”. Pode parecer confuso pensar em “máquinas” quando se fala do desejo. O que nos vem à mente é sempre o maquinismo técnico de inspiração cartesiana – do corpo funcionando como máquina. Ou, das máquinas técnicas de produção de produtos de consumo. Olhando diretamente n’ O Anti-Édipo, é possível perceber que os autores têm inspiração de diversos campos de conhecimento ao elaborar o conceito de máquinas. Do vitalismo biológico ao maquinismo técnico, existem muitos “pedaços” de muitas áreas de conhecimento. Eles foram “catadores” – bricoleurs , como

Submissão VI

  O fundamento do mundo é desejo - condição necessária da liberdade de todos os seres vivos. Desejar é o ato supremo da existência de qualquer vida orgânica.   Os organismos se movem por desejo, mas já não se pode pensar o desejo restrito aos objetos como se existisse um objeto que respondsse ao desejo.   Todo movimento da vida, todas as funções orgânicas – incluímos o mental na categoria de organismo – os sonhos, as volições, as angústias e dores, tudo tem como fundo a energia desejante. Desde um organismo unicelular - passando pelos vírus e por bactérias, até chegar ao homem - a força que move esses indivíduos a nutrirem-se e a reproduzirem-se até o seu limite de existir, é desejo. Mesmo os organismos que se classificam como “malignos”. Eles crescem e nos devoram, impulsionados pelo mesmo desejo que faz um jardim florir. Na verdade, a malignidade não passa de um conceito   moral que não funciona na relação com a natureza. Chamamos “maligno” a tudo que nos escapa ao

Submissão V

Na realidade mitológica, os gregos parecem ter mais consciência do que o ocidente judaico-cristão. Para eles, é tudo representação do jogo de forças, agindo e reagindo no mundo. O grande erro ocidental é tomar essas forças como se fossem entidades mesmas – Deus e o Diabo. O “diabo cristão” só existe em relação aos moradores da Terra. Não se pode imaginar a presença do diabo fora da terra. Mas no caso grego, onde os elementos são forças, o cosmos é a dimensão onde tudo se dá. Ou seja, onde houver espaço, existirá um jogo de forças em ação. E consequentemente, em qualquer lugar pode estar existindo uma espécie de criação nova. Os gregos usam as noções de forças desmensuradas e forças mensuráveis, complacentes e rebeldes. O filósofo alemão, Friedrich Nietzsche diz que são forças ativas e forças reativas. O pai da psicanálise fala das mesmas forças como sendo duas qualidades de pulsão – de morte e de vida, de conservação e demolidoras. Os gregos são os primeiros a dizer do desejo c

Submissão IV

O desejo (libido) se encontra em estado puro em forma de singularidades impessoais pré-individuais e pré-subjetivas. O desejo no bebê é um campo de variação intensiva que atravessa todo o corpo. Na relação com o outro que cuida – de toques e carícias - o desejo se transforma em energia libidinal. O bebê mamando no seio, não sacia apenas a fome, mas experimenta prazer na relação com o corpo da mãe. Não se trata do ato frio de saciar a fome do bebê, mas também da troca de energias prazerosas entre os dois. Nesse momento, os corpos são entidades de corte-fluxos de desejo. O seio possui suas micromáquinas de emissão de leite. A boca do bebê é uma máquina de sugar. Não é apenas isso, o fluxo material do líquido salta para os fluxos de circulação de energia libidinal que, nesse momento, não tem nenhuma primazia sobre áreas específicas do corpo – todo o corpo é uma zona erógena. Não existe culpa, e o complexo de Édipo da psicanálise não faz sentido algum nesse caso. Ainda não ex

Submissão III

Não é simples reprimir o desejo no plano de uma politica de Estado. É preciso que seja algo mais sutil para que aconteça sem que o submetido venha a se dar conta. São necessários longos processos com início na mais tenra idade – processos de subjetivação que se iniciam no nascimento e terminam ao final da vida do sujeito - Félix Guattari faz uma diferença entre molar e molecular – a política no nível molar se remete às grandes estruturas políticas dos partidos e sindicados. E uma micropolítica que se identifica com as formações moleculares por se tratar de planos micrológicos que passam imperceptíveis no nível da consciência que já é de formação molar. O desejo é pré-subjetivo. Ele existe em forma de fluxos que atravessam os corpos. Não se relaciona a objetos que faltam ao indivíduo e não se destina a eles. É o indivíduo mesmo que, movido por puro desejo, cria a falta e os objetos – mas nada falta ao desejo por que ele preexiste a tudo. Os indivíduos são corpos e pontos de i

Submissão II

Antes de tudo, é preciso analisar a questão pelo prisma politico, de uma política de repressão ao desejo. Fazer com que o desejo seja uma questão de ignominia ao indivíduo e à sociedade - desejo como falta em ser. É a tese cristã neoplatônica. Fazer acreditar que o homem é faltoso, incompleto - e por isso, deseja. Atrela-se o desejo a objetos proibidos como se em sua origem o desejo dependesse de algo que lhe faltasse. Desde os “mitos de origem” é um objeto proibido que é colocado como causa suprema da desordem e a punição ao desejo como a causa da ordem – no mito do pai da Horda Primitiva, no mito do Éden ou na Torre de Babel. É o encontro do desejo de transgredir e a punição dos deuses que submete. Uma dupla crença nascida em mitos: desejamos por que não temos e, desejar ter o que não se tem, como foi o caso, é um pecado. No cristianismo é tudo culpa do “pecado original”. O homem é “fraco e defeituoso”, débil e de natureza pecaminosa. Daí, a necessidade da submissão e da renu

Submissão

Por que milhares se submetem a um? Essa questão, muito semelhante ao que diz Espinoza, foi levantada por Étienne de La Boétie (1530 - 1575) filósofo francês. Mais tarde, o filósofo dinamarquês Benedito Espinoza (1632 – 1677) complementa: “por que os homens lutam por sua submissão como se fosse pela liberdade?”. Por que chegam a se orgulhar de sua escravidão? Por que o povo luta tanto para seguir e ser seguido? Não nos iludamos com a humildade dos seguidores. É tudo uma questão de desejo. Eles desejam uma parcela de poder. A submissão é uma forma camuflada de desejo de ter poder. Poder de exercer o julgamento, sobretudo, se a pratica de julgar lhe for dada pelo soberano que é seguido. Não há muita diferença disso em relação ao nazismo. “O povo alemão não foi enganado”, o povo alemão desejava o poder através da paranoia do superior que eles seguiam – milhares seguindo a um. Em nossos dias a submissão vestiu uma nova roupagem. São milhares de seguidores de promessas das “graça

(Com) Possibilidades

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O termo acima remete a filosofia de Leibniz (1646 – 1716) – compossibilidade dos mundos. O que vou fazer não se identifica com Leibniz, ele fez filosofia, eu estou jogando um jogo de palavras para me divertir com elas. Digamos que não quero deixar morrer a “criança dentro de mim”. Estou juntando imagens de filmes – Matrix, Fenda no tempo, Contra o tempo e Show de Truman . São belos filmes – me divirto com eles. Os filmes transitam entre imagem e tempo de forma extraordinária. Os produtores de filmes são gênios. Toda imagem num filme pressupõe um “mundo” que o expectador olha e vê, e outro, que não se vê, mas que faz parte da imagem atual por que se liga à cena em desenvolvimento e/ou à imagem virtual que o diretor quis criar em forma de sensações no expectador. Os filmes são sempre feitos de composição de mundos – diversos mundos que coexistem dentro de um - que é o filme mesmo.  A vida dos indivíduos não é muito diferente disso. Pensemos juntos no fato de haver um

Ilusões

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Nosso sistema sensório motor está adaptado para não perceber a diferença entre a “ilusão e a percepção”. Talvez pelo fato de haver uma vontade de ver as coisas que desejamos ver fundadas em nossas crenças e valores - verdades subjetivas. Olhamos o mundo como se estivesse juridicamente organizado. Num oceano de ingenuidade buscamos ver a identidade correspondente a tudo que nos falaram dele - que o mundo é harmonioso é belo ou que é triste e feio. Tendo essas crenças sobre o mundo submetemos nosso sistema perceptivo numa busca inconsciente da justaposição dos nossos sentidos a tudo que nos cerca – como se fossemos advogados de uma crença, buscamos a jurisprudência que sustenta nossos valores do mundo e da vida. Se as conclusões que temos acerca da natureza em geral estão inteiramente dependentes do sistema sensório motor - refém de nossa vontade de ver e sentir o que a priori acreditamos – são as percepções que se perdem em meio às ilusões. A imagem acima é da m

Drogas

É domingo de manhã no meio do território dos usuários de crack. Avenida Brasil - não sei exatamente onde, pode ser Bonsucesso - RJ. Nesse bairro algumas ruas têm nomes conhecidos – Paris, Londres, Nova York. Os usuários de crack se espalham por essas ruas e avenidas de belos nomes, caem em seus pedaços de papelão e dormem entre intervalos de repetições infindas. É um quadro patético, mas assustador. Um amontoado de farrapos. Grande paradoxo: a liberdade que dá início ao uso das drogas e a incapacidade de decidir quando parar de usar. Outro paradoxo fica por conta dos sistemas de saúde – internação compulsória ou respeitar o direito de se drogar até a morte. Existem casais deitados sob o efeito de uma “fumada” recente. Parecem unidos numa causa comum “até que a morte os separe”. São todos cúmplices junto ao pequeno traficante que se imiscui entre eles. Os casais, abraçados dividem um cobertor sujo, marcado por respingos escurecidos de vomito. Nos olhares, a velocidade do desej

Oikos – casa

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As palavras na língua grega são muito ricas em sentido. Nesse exemplo – oikos - vai muito além de uma casa como conhecemos - lugar de quatro paredes com divisões para dormir, comer, e fazer a higiene pessoal. Oikos se remete ao conceito atual de ecologia. O ambiente inteiro como morada. Não a morada do “homem senhor da natureza”, mas de todas as vidas que nele existem. Vamos avançar mais na riqueza de sentidos do termo. Pensemos no ato reflexivo de produção de subjetividade – de tudo que entra na cabeça dos indivíduos humanos, faz uma dobra no psíquico, e sai na forma de representar o mundo. Essa dobra é a maneira do ser humano ver o mundo – uma força nos atrai para as coisas, e outra, nos impõe o agir na representação desse mundo. Dessa forma, há um sentido mais extenso para oikos, quando voltamos nosso pensamento para áreas mais secretas de nosso desejo, onde tudo é por ele determinado. Assim, pelo lado de dentro de nossas percepções, é possível que destruamos nossas “