Síntese disjuntiva de registro




A segunda síntese é disjuntiva de singularidades e de cadeias, e a energia (Numen) que anima essa síntese é a energia de separação. Ela produz uma associação por distribuição em cadeia; a máquina é a máquina paranoica que funciona por repulsão. A máquina miraculante e a máquina paranoica perfazem a lei da atração e da repulsão.
A produção é a produção de registro. É quando os órgãos se apegam à superfície do corpo sem órgãos, constituindo sínteses em cadeias, quando a disjunção é positiva se trata de esquizofrenia – nesse caso, a síntese é inclusiva: as categorias se aceitam e se vinculam umas às outras. Outra vez, enfrenta-se o problema do uso. Quando se pensa que a sociedade reprime o desejo, o questionamento já se encontra atrasado em relação às operações fascistas em um nível molecular. Trata-se do uso ilegítimo das sínteses do inconsciente. O uso legítimo da segunda síntese é inclusivo e ilimitado, em oposição ao uso indevido, que é exclusivo e limitado.
No primeiro caso, “uma disjunção que continue a ser disjunção, mas que afirme os termos disjuntos, e que os afirme através de toda a sua distância. (...) ‘Quer, quer’ no lugar de ‘ou então’”.[1] Em vez de uma e outra e outra, temos uma ou outra, ou outra... a vinculação aditiva cede lugar à alternativa. “Não identifica os dois contrários no mesmo, mas afirma a distância deles como aquilo que os relaciona um com outro enquanto diferentes.”[2]
Sua energia é o Numen, o mesmo que vontade divina. Aqui, os órgãos se ligam ao corpo sem órgãos, constituindo sínteses sobre sua superfície e formando cadeias. Quando a disjunção é positiva, temos a esquizofrenia, a síntese é inclusiva, as categorias se aceitam e se vinculam; quando negativa, a disjunção é capitalista – nesse caso, as disjunções passam a ser exclusivas e passam a separar e excluir os elementos. Mas, em seu uso devido, as disjunções “não obedecem a um plano, trabalham em todos os níveis e em todas as conexões; cada um fala a própria língua e estabelece sínteses com outros, que são tanto mais diretas em transversal (...)”. O corpo sem órgãos atrai a produção desejante e faz sínteses com o universo esquizofrênico com todas as categorias. “As disjunções próprias dessas cadeias ainda não implicam exclusão, apenas surgindo as exclusões devido a um jogo de inibidores e de repressores que determinam o suporte e fixam o sujeito específico e pessoal.” As cadeias conectivas se ligam por fragmentos de outras cadeias, é o que coloca os indivíduos em devir, quando uma cadeia “extrai uma mais-valia, tal como o código da orquídea ‘extrai’ a figura à vespa: fenômeno de mais-valia de código. (...) A única vocação do signo é produzir desejo, e em todos os sentidos”.[3]
O mesmo não acontece quando a síntese disjuntiva, de distribuição em cadeias, tem seu uso pervertido em ilegítimo (exclusivo e limitativo). Trata-se do ideal de certa utilização das sínteses disjuntivas. É a binarização que divide tudo em pontos cardinais. Aqui os gonzos, os cardos, submetem o tempo que “permanecem em seus gonzos, há uma subordinação ao movimento extensivo: ele é sua medida, intervalo ou número”.[4] Se fosse estabelecer uma oposição em relação ao tempo lógico da psicanálise, diríamos que esse tempo marcado é o tempo do paranóico, mas o tempo fora de seus gonzos é o do esquizofrênico.
A introdução dos primeiros movimentos na arte da geografia se dá por aí: a posição do corpo rege o mundo em apenas quatro pontos cardinais. O mesmo ocorre com as demais ciências, com suas raízes diferenciantes, tudo se estende a partir de um ponto. Não é só na escola ou na casa que as coisas se fabricam. O uso indevido das sínteses impregna territórios globais, neste caso, “é o domínio do
‘Ou então’, na função diferenciante da proibição do incesto: a mamãe começa aqui, o papai ali, e acolá tu. Deixa-te estar no teu lugar. (...)”. É quando se pergunta: quem é você? De que família você é? O que você é? “E ‘ser pai ou filho’ é também acompanhado por duas outras diferenciações sobre os lados do triângulo, ‘ser homem ou mulher’, ‘estar morto ou vivo’.”[5]


[1] Idem, pp. 88-89.
[2] Idem, p. 90.
[3] Idem, p. 47.
[4] DELEUZE, G., Critique et clinique, p. 36.
[5]  DELEUZE, G. e GUATTARI, F., L’Anti-Oedipe,  pp. 89-90.

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