Conclusão da terceira síntese
O sujeito foge do centro, mas se encontra em qualquer lugar, pois tudo
é atravessado por singularidades da “rede disjuntiva, ou de estados intensivos
no tecido conjuntivo, e um sujeito transposicional por todo o círculo, passando
por todos os estados”.[1]
Não há identificação com pessoas, mas a identificação dos nomes da história com
zonas de intensidade sobre o corpo sem órgãos; e o sujeito grita sempre “Afinal
sou eu!”.[2]
Ele está solto, avulso, sua máquina é celibatária, não existe somente a
repulsão, nem somente a atração, mas as duas juntas, num movimento combinado,
associativo. Por isso é chamada de síntese conjuntiva de intensidades e
devires. A dualidade “positivo/negativo” aqui ocorre entre um polo
despótico-paranoico e o signo-figura do esquizo. O uso ilegítimo dessa síntese
a torna segregadora e biunívoca. Ser deste ou de outro país, ser do Primeiro,
Segundo ou Terceiro Mundo. Ser militar ou civil. Homem ou mulher. Trabalhador
ou desempregado, judeu ou palestino, do bem ou do mal: terrorista iraquiano ou
democrata/republicano. Não confundir com o déspota paranoico, que existe, mas é
uma projeção no campo social do que ocorre na primeira síntese do inconsciente.
Vamos encontrar na sociedade, em proporções ampliadas o mesmo que
encontramos no inconsciente. É o que justifica a tese da micropolítica e, ao
mesmo tempo, explica a ignorância quanto aos acontecimentos históricos e
sociais.
Há o uso legítimo de cada síntese e um uso ilegítimo de apropriação de
cada síntese no campo social. O erro da psicanálise consistiu em permanecer do
lado do uso ilegítimo. Tudo começa pela interpretação do inconsciente. O
inconsciente é intensivo, apsicológico, pré-individual, molecular. Mas há
também um uso ilegítimo do inconsciente. Quando se faz dele uma utilização
segregativa das sínteses conjuntivas que não coincidem com as divisões de classe,
embora seja uma arma incomparável nas mãos de uma classe dominante.
De um modo amplo, pode-se dizer que o uso devido do inconsciente se
circunscreve ao plano de imanência que caracteriza o inconsciente apsicológico,
tal inconsciente é imanente e se autoproduz. Por outro lado, o uso indevido das
sínteses do inconsciente se remete ao inconsciente produzido a partir de uma
transcendência.
A divisão e a separação em hierarquias dessas sínteses passam
despercebidas, porque se instalam em nível micro. Quando se percebe, já está
formada a divisão: é ela que provoca o sentimento de ‘estar bem em casa’, de
fazer parte de uma raça superior ameaçada pelos inimigos do exterior. Como pode
esse acontecimento do âmbito inconsciente projetar-se no social?
“O Édipo é que depende de um tal sentimento nacionalista, religioso,
racista, e não o inverso: não é o pai que se projeta no chefe, mas é o chefe
que se aplica ao pai (...) para nos dizer ‘não podes superar o teu pai’.”[3]
Esse fenômeno ganha proporções ampliadas no mapa múndi.
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