Religião


Consta numa igreja do centro da cidade uma escritura do santo padre Leão XIII: “concedo 100 dias de indulgência aos fiéis que esta cruz beijarem com devoção recitando um padre nosso”. A mais de um século os adultos continuam acreditando nesses 100 dias de liberação de suas culpas.

Desde que os pais internalizaram a lógica do castigo e da recompensa, ligada a doação de afeto e graça aos filhos, em troca de obediência, já não será mais de um pai externo que os seres humanos precisarão, mas da estrutura por eles interiorizada na mente dos filhos.

Do pai presente dentro de casa, ao pai abstrato de Roma e, por extensão, ao Padre Nosso celestial, são modos de subjetivação que faz o “bicho homem” obedecer e acreditar nas recompensas. É um movimento de fora para dentro, as figuras de autoridade se transformam em estruturas psíquicas que passam a operar no lugar das primeiras.

Depois de se interiorizar, separar e marcar na mente e no organismo as noções de recompensa e castigo, é outra forma de juízo que se faz valer nos indivíduos. Não é mais o outro – pai, padre ou Deus, que pune e recompensa –, mas o indivíduo mesmo numa relação psíquica de juiz de si.

O ego, qual bom filho se sentirá recompensado, orgulhoso e vaidoso da humildade no ato de se ajoelhar e beijar a cruz. Mas é o superego no lugar de pai severo que recompensa o “bom filho” para, depois, exigir-lhe (do ego) maior submissão.

O motivo que o levou ao infindável processo de remissão foi o desejo originado no inconsciente reprimido e que o levará de novo para manter a cadeia, da culpa ao perdão.

Quantos beijos já não marcaram a cruz! Trata-se da religião, de uma psicologia religiosa que retira em parte a responsabilidade e faz do homem um inocente trapaceiro por 100 dias, mas como tudo pode se renovar, pela vida toda.

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